terça-feira, 30 de junho de 2009



O Sino de Ouro


Contaram-me que, no fundo do sertão de Goiás numa localidade de cujo nome não estou certo mas acho que é Porangatu,que fica perto do rio Ouro e da Serra de Santa Luzia,ao Sul da Serra Azul mas também pode ser Uruaçu, junto do rio das Almas e da Serrado passa três(minha memória é traçoeira e fraca;eu esqueco os nomes das vilas e a fisionamiados irmãos, esqueço os mandamentos e as cartas e até a amada que amei com paixão) mas me contaram em Goiás, nessa povoação de poucas almas, as casas são pobres e os homens pobres, e muitos são parados e doentes e indo lentes, e mesmo a igreja é pequena, me contaram que ali tem coisa bela e espantosa um grande Sino de Ouro.
Lembrança de antigo esplendor,gesto de gratidão, dadiva ao Senhor de um grã-senhor nem Chartres, nem Colômbia, nem S.Pedro ou Ruão, nenhuma catedral imensa com seus enormes carilhões tem nada capaz de um som tão lindo e puro como esse sino de ouro, de ouro catado e fundado na própria terra de goiana nos tempos de antigamente.
É apenas um sino,mas é de ouro.De tarde seu som vai voandp em ondas mansas sobre as matas e os cerrados, e as veredas de buritis, e a melancolia do chapadão, e chega ao distante e deserto carrascal, e avança em omdas mansas sobre os campos imensos, o som do sino de ouro.E a cada um daqueles homens pobres ele da cada dia sua razão de alegria.Eles sabem que todos os ruídos e sons que fogem do mundo em procura de Deus-gemidos, gritos, blasfémias, batuques, sino, orações, e o murmúrio temeroso e agônoco das grandes cidades que esperam a explosão atómica e no seu próprio ventre negro parecem contar o germe de todas as explosões- eles sabem que Deus, com especial elidia e alegria ouve o som alegre do sino de ouro perdido no fundo do sertão.E então é como se cada homem, o mais pobre, o mais doente e humilde, o mais mesquinho e triste, tivesse dentro da alma um pequeno sino de ouro.
Quando vem o forasteiro de olhar acesso de ambição e propõe negócios, fala em estradas, bancos, dinheiro, obras, progresso, corrupção. Dizem, que esses goianos olham o forasteiro com um olhar lento e indefinível sorriso e guardam um modesto silêncio.
O Forasteiro de voz alta e fácil não compreende fica diante daquele silêncio, sem saber que o goiano esta quieto, ouvindo bater dentro de si, com um som de extrema pureza alegria, seu particular sino de ouro.Ouro que não serve para perverter, nem o homem nem a mulher, mas para louvar a Deus. E se Deus não existisse não faz mal.
O Ouro do sino de ouro é neste mundo o único de alma pura, o ouro no ar, o ouro da alegria.Não sei se isso aconteceu em Porangatu, Uruaçu ou outra cidade do sertão.Mas quem me contou foi um homem velho que esteve lá, contou dizendo, "eles têm um sino de ouro e acham que vivem disso, não se importam com nada, nem querem mais trabalhar fazem apenas o essencial para comer e continuar a viver, pois acham maravilhoso ter um sino de ouro."
O homem velho me conto isso com espanto e despresso.Mas eu contei a uma criança e nos seus olhos se lia seu pensamento, que a coisa mais bonita do mundo deve ser ouvido um sino de ouro. Com certeza é esta mesma coisa opinião de Deus, pois ainda que Deus não exista ele só pode ter a mesma opinião de uma criança.Pois cada um de nós quando criança tem dentro da alma seu sino de ouro que depois, por nossa culpa e misseria e pecado e corrupção, vai virando ferro e chumbo vai virando pedra e terra, e lama e podridão.




Conto:Rubem Braga São Paulo
Global,1985